24.6.15

História da Criptografia - Cifras e Códigos

  • Idade Antiga (4000 a.C. a 476 d.C.):
Segundo historiadores, a criptografia surgiu por volta de 2000 a.C. com o uso de hieróglifos criptografados. 
Entre 600 e 500 a.C. surgiram as cifras hebraicas: Atbash, Albam e Atbah.
Atbash: consiste em trocas no alfabeto hebreu, onde a primeira letra (Aleph=א) é substituída pela última (Tav=תּת), a segunda (Beth=תּב) pela penúltima (Shin=ש) e assim em diante e vice-versa, dando origem ao nome ATBASH=Aleph,Taw,Beth,Shin.
Albam: substitui a primeira letra (Aleph=א) pela décima segunda (Lamed=ל), a segunda (Beth=תּב) pela décima terceira (Mem=מ) e assim em diante e vice-versa, originando o nome ALBAM=Aleph,Lamed,Beth,Mem.
Atbah: troca a primeira letra (Aleph=א) pela oitava (Teth=ט), a segunda (Beth=תּב) pela sétima (Heth=ח) e assim em diante de vice-versa, dando  origem ao nome ATBAH=Aleph,Teth,Beth,Heth.

Na Grécia, os espartanos inventaram o Scytale ou bastão de Licurgo que era um bastão de madeira (cítala) enrolado por uma tira de couro ou pergaminho, onde o texto era escrito nesse pergaminho no sentido do comprimento do bastão. Para decifrar a mensagem bastava enrolar o pergaminho em outra cítala de mesmo diâmetro. Para eles a cítala era como a chave das criptografias modernas.

Scylate ou bastão de Licurgo

Ainda na Grécia surge o Quadrado de Polybius, descrito pelo historiador Polybius em 150 d.C., que consiste em um quadrado 5x5 onde são distribuidas as letras do alfabeto (com I e J na mesma posição). Para criptografar, cada letra é associada à um número de 2 dígitos (formado pela linha e coluna). As letras não eram fixas, podendo ser colocadas no quadrado aleatoriamente oferecendo inúmeras possibilidades de variação da cifra.
Quadrado de Polybius

Em Roma, Júlio César desconfiado de seus mensageiros, usava a técnica de substuir a letra original por outra que se encontra a algumas posições a frente desse mesmo alfabeto, por exemplo: A=D, B=E, C=F e assim em diante, nesse caso a chave=3 devido as 3 posições andados no alfabeto. E assim surgiu a cifra de César.

  • Idade Média (476 a.C. a 1453 d.C.):
O filósofo, cientista e matemático al-Kindi escreveu Um Manuscrito sobre Decifração de Mensagens Criptográficas, que fala como decifrar mensagens de acordo com a frequência que os símbolos aparecem, sendo considerado o livro mais antigo sobre análise de frequências.

Na Europa, a criptografia era usada por reis que queriam manter seus segredos, por alquimistas que tinham receio de que seus estudos caíssem nas mãos da Igreja Católica e fossem parar na fogueira e pelos clérigos da igreja que buscavam um significado oculto na bíblia, e onde a cifra de Atbash foi encontrada em várias passagens.

A Ordem dos Cavaleiros Templários desenvolveu sua própria cifra, na qual o cifrante era extraído da cruz "das oito beatitudes". A cifra era uma substituição simples onde cada letra era trocada por um símbolo especial.

  • Idade Moderna (1453 a 1789):
Leon Battista Alberti (1404-1472) escreveu um ensaio sobre uma nova cifra, a cifra polialfabética, inventando o Disco de Alberti. O disco é composto por 2 discos concêntricos, um externo e outro interno. O disco externo é fixo, com 24 casas contendo 20 letras latinas maiúsculas (com U=V) e números de 1 a 4. O disco interno é móvel, com 24 letras  minúsculas utilizadas como índice (por exemplo a letra c) e então o disco interno é ajustado com a letra maiúscula correspondente do segundo disco (por exemplo a letra H). Os números de 1 a 4 são nulos.
Disco de Alberti

Em sua substituição polialfabética, Leon Battista Alberti também utilizava um quadrado composto por 26 linhas e 26 colunas contendo todas as letras do alfabeto, ficando conhecido como Quadrado de Trithemius devido ao primeiro livro impresso sobre criptografia Poligrafia em seis livros por João Trithemius, abade de Wiirzburg, anteriormente de Sponheim, dedicados ao Imperador Maximiliano escrito em 1518 pelo abade e ocultista alemão Johannes Trithemius (1462-1516). Trithemius também escreveu a obra Steganographia que tinha uma cifra chamada Ave Maria que era uma suposta oração, mas na verdade era uma mensagem esteganográfica pois cada letra era representada por uma frase da oração. Mas a sua maior contribuição foi a Tabela Reta (tabula recta) que consiste em um quadro, onde cada letra do texto plano deve ser encontrado na coluna à esquerda e cifrado com a letra da primeira linha da coluna ao lado. Por exemplo, o texto plano "Johannes Trithemius" seria encriptado da seguinte forma: a letra J deve ser encontrada na coluna à esquerda e mapeado com a primeira linha (letra A) tornando-se J. A letra O mapeado com a primeira linha da coluna ao lado (letra B) tornando-se P, o H com C ficando J e assim em diante surgindo a mensagem cifrada "JPJDRSKZ BASETRAXKJ".
Tabela Reta

No final do século XVI, Blaise de Vigenère (1523-1596) escreveu Traité des chiffres ou secrètes manières d'écrire na qual fala sobre as criptografias usadas na época. Um dos métodos descrito por Vigenère que utiliza o Quadrado de Trithemius e uma palavra chave para cifrar mensagens foi originalmente proposto por Giovan Battista Bellaso em seu livro La cifra del. Sig. Giovan Batista Belaso, mas ficou conhecida como Cifra de Vigenère. A cifra funciona escrevendo a palavra chave sobre o texto plano, letra sobre letra e repetindo a mesma palavra até que o texto termine. Para cifrar é preciso ter o Quadrado de Trithemius e cada letra da cifra é obtida pela intersecção da linha da palavra chave com a coluna da letra do texto. Para decifrar o receptor deve escrever o texto cifrado sob a chave, letra com letra utilizando o Quadrado de Trithemius.

Além desse sistema, Vigenère também inventou a Cifra de Auto Chave, utilizando uma palavra-chave. Para encriptar o texto plano a palavra-chave é colocada em cima do texto plano, por exemplo:
Chave-secreta C R I P T O G R A M
Texto-plano M S G S E C R E T A
Utilizando a Tabela Reta, localiza-se a letra M na coluna à esquerda e a letra C na primeira linha e substitui pela letra O, localiza a letra S e a letra R tornando-se J, e assim em diante formando a mensagem cifrada: "OJOHXQXVTM".
A cifra de Vigenère permaneceu inquebrável por 300 anos, até que no século XIX, Charles Babbage da Inglaterra (considerado como o pai do computador moderno) e Friedrich Kasiski da Alemanha conseguiram quebrar a cifra.

  • Idade Contemporânea:
No século XIX,  surgiu o Telégrafo que permitia a comunicação à longas distâncias, porém não havia um meio de garantir a segurança da informação transmitida que poderia ser interceptada, reforçando assim o uso da criptografia.

A criptografia aos poucos foi se popularizando, surgindo alguns romances e contos envolvendo esse tema como Viagem ao Centro da Terra de Júlio Verne e o Escaravelho de Ouro de Edgar Allan Poe. Para mais detalhes, leia o artigo Edgar Allan Poe e a Criptografia.

O físico italiano Guglielmo Marconi criou a comunicação via rádio, tornando-se um grande aliado dos militares durante a Primeira Guerra Mundial. Nesse mesmo período, os alemães criaram a cifra ADFGX usando o quadrado de Polybius, trocando os números 12345 pelas letras ADFGX. O texto plano era cifrado usando essa tabela, depois era escolhido uma palavra-chave (de qualquer tamanho desde que as letras não se repitam) que era colocada em uma nova tabela na primeira linha. Depois o texto cifrado era colocado nessa tabela nas linhas seguintes. A palavra-chave deveria ser reorganizada de forma que as letras ficassem em ordem alfabética (trocando as colunas). A mensagem cifrada era formada pelas colunas, excetuando a primeira linha da palavra-chave. Posteriormente, foi desenvolvida a cifra ADFGVX que incluia os números de 1 à 9.

Cifras ADFGX e ADFGVX

Em 1917, o engenheiro Gilbert Stanford Vernam cria uma máquina cifrante baseada na cifra de Vigenère, ficando conhecida como Cifra de Vernam. Em 1918, Joseph Oswald Mauborgne aperfeiçoa a técnica de Vernam e cria o One-Time Pad. A cifra OTP consiste em uma sequência de letras randômicas utilizadas somente uma vez por mensagem, sendo do mesmo tamanho da mensagem. Quanto maior a mensagem mais difícil de ser quebrada por isso os espiões usavam trechos de livros como chave. Para cifrar basta combinar as letras randômicas com o texto-plano, somando seus valores numéricos módulo 26, devido as 26 letras do alfabeto. Por exemplo:
Texto-plano C R I P T O G R A M A
Chave-randômica T S K U E I C W N N G
Somando o valor numérico da letra C com a letra T temos (3+20%26=23, letra W), somando a letra R com S módulo 26 temos a letra K e assim sucessivamente gerando a mensagem cifrada: "WKTKYXJOOAH".

Ainda em 1918, o engenheiro elétrico Arthur Scherbius cria a máquina de cifragem Enigma, considerada a máquina de cifragem mais importante de todos os tempos. O Enigma foi usado pelos nazistas durante a Segunda Guerra Mundial e era composto por um conjunto de 3 à 8 rotores, um teclado, um conjunto de luzes para cada letra do alfabeto e um mostrador. Seu funcionamento consistia em configurar a chave, digitar uma letra, que estimulava o circuito elétrico gerando as cifras através dos rotores fazendo com que a letra cifrada fosse iluminada no painel. O operador escrevia a letra cifrada em um papel compondo a mensagem. Finalmente, a mensagem cifrada era enviada via rádio usando código morse. O Enigma era considerado seguro devido aos 3 rotores que garantiam a mistura das 26 letras de forma aleatória, com 26*26*26=17576 possibilidades. Fora isso, os rotores podiam mudar a ordem com 3!=6 possíveis combinações e 100.391.791.500 possíveis conexões quando os 6 pares de letras do painel eram conectados, dessa forma o Enigma podia encriptar um texto usando  1016 (17,576 * 6 * 100,391,791,500)  combinações.
Enigma
Marian Rejewski foi recrutado pelo departamento de cifras polonês chamado Biura Szyfrów para tentar decifrar as mensagens cifradas pelo Enigma pela alemanha, criando a chamada Bomba, uma máquina de decifragem do Enigma. Os militares germânicos foram aprimorando o Enigma, impossibilitando sua quebra pelos poloneses. Então os poloneses resolveram divulgar seus estudos aos aliados. Em Bletchley Park, a sede da Escola de Cifras e Códigos do Governo (GC&CS) na Inglaterra, surge Alan Turing (1912-1952) que dedicou-se em encontrar as fraquezas do Enigma, conseguindo encontrar padrões que facilitaram sua quebra. Turing desenvolveu uma versão melhorada da Bomba de Rejewski, conhecida como Bomba de Turing.
Bomba de Turing, cena do filme O Jogo da Imitação

Durante a Segunda Guerra Mundial, os ingleses e americanos possuiam sua própria máquina de cifragem, a Typex e SIGABA, porém elas eram inviáveis na prática por exigirem trabalho manual e serem lentas. Então, em 1942 o engenheiro Phillip Johnston resolveu recrutar os nativos Navajos, pois eles eram o único povo na qual a alemanha não tinha entrado em contato. Eles fizeram um treinamento com os índios, apresentando aviões, navios e submarinos, associando com o nomes de pássaros e peixes. Assim, os nativos ajudaram os aliados a vencerem a guerra cifrando as mensagens dificultando o trabalho dos criptoanalistas alemães.

Fora o Enigma, a Alemanha possuia a máquina de cifragem Lorenz SZ40, utilizada por Hitler. O matemático Max Newman criou um projeto baseado na máquina de Turing para quebrar essa máquina, o computador programável Colossus, o primeiro computador da história.

O computador foi se popularizando com o tempo, principalmente depois do surgimento do transistor e do circuito integrado. O mesmo ocorreu com a criptografia.

  • Criptografia Moderna:
Nos anos 70, a IBM cria o DES (Data Encryption Standard) a fim de padronizar a criptografia.

Em 1976, Whitfield Diffie e Martin Hellman publicaram um documento chamado As Novas Direςões da Criptografia, introduzindo a idéia da criptografia de chave pública.

Em 1977, Ronald L. Rivest, Adi Shamir e Leonard M. Adleman discutiam em como fazer um sistema prático para criptografia de chave pública. Em uma noite de Abril, Ron Rivest ficou de cama devido a uma terrível dor de cabeςa e o algoritmo RSA (Rivest-Shamir-Adleman) veio à ele. Tratava-se de uma cifra de chave pública utilizada para confidencialidade e assinaturas digitais, baseado na dificuldade de fatorar números grandes.

Em 1982 surgiu cifra rot13, introduzida no grupo de notícias Usenet a fim de censurar suas mensagens. O rot13 consiste em uma cifra de César, na qual anda-se 13 posiςões para frente ou para trás ao longo do alfabeto.





* Fontes:
[1] A Matemática e os códigos secretos: Uma introdução à criptografia. COSTA D.D.
[2] Criptografia: aspectos históricos e matemáticos. - SILVA A. F.; MARTINS R. M.
[3] Segurança de Redes de Computadores. - SOUZA R. J. C.
[4] http://crypto.interactive-maths.com/polyalphabetic-substitution-ciphers.html
[5] http://practicalcryptography.com/ciphers/autokey-cipher/
[6] Applied Cryptography. SCHNEIER B.
[7] http://ciphermachines.com/enigma.html#tech
[8] A Criptografia e seu Papel na Segurança da Informação e das Comunicações (SIC) - Retrospectiva, Atualidade e Perspectiva. - CRUZ E. F.
http://www.rot13.com/info.php
http://www.math.cornell.edu/~morris/135/timeline.html

0 comentários:

Postar um comentário